quinta-feira, 19 de novembro de 2020

1997. O ano de um novo ciclo pessoal

 Em 1997, tive contato com uma empresa que tinha acabado de importar uma máquina gráfica digital a laser e estava imprimindo cartões de visita a pronta entrega. Quando vi pela primeira vez não acreditei, mas percebi que poderia operar, pois conhecia o sistema e tinha jeito para o computador.

Foi então que as coisas começaram a mudar para mim e para a minha “lindona” Tati. Bom, para ela mudou para pior, mas foi o que fez seguirmos até aqui. A Tati morava na divisa entre o ABC e a cidade de São Paulo e para chegar até lá era preciso ir de carro, pois de ônibus e metrô levava perto de três horas, ida e volta, até a Mooca.

Nesse meio tempo, recebi uma verba de um pedido grande que fiz, de impresso para uma multinacional, e resolvi trocar de carro! Vendi o “pau véio” do Prêmio e coloquei toda a verba no banco, juntamente com a última comissão.

Tomei o metrô e fui comprar um carro novo em uma concessionária, na Zona Norte de São Paulo. Não sei por que lá, mas o meu destino estava traçado naquele dia. Já dentro do metrô, eu vi um cidadão lendo um jornal, em que na capa tinha um anúncio da ABIGRAF, feira da indústria gráfica, no centro de exposições Anhembi, também em São Paulo. Aquilo me chamou a atenção e eu pensei: não custa dar uma passada por lá, é no caminho mesmo.

Estava iniciando naquele momento uma nova etapa da minha vida, muita coisa boa, muitas alegrias, e lógico, fechando o ciclo com todo o restante.

Em julho de 1997, desci do metrô e fui para dentro da feira. Chegando lá fiquei maravilhado com tanta novidade, tecnologia, máquinas, opções etc.

Depois de rodar umas duas horas pela feira conheci um espanhol, em um estande de uma marca que não conhecia e que estava chegando ao Brasil: a LEXMARK. Ele me chamou e perguntou o que estava procurando, eu disse que não sabia, mas que estava perto de achar. Ele colocou a mão no meu ombro e disse: “Vem aqui na salinha privada que vou mostrar uma máquina que é o seu número e para caras da tua idade, que conseguem entender o novo caminho da impressão do futuro”.

Chegando lá na salinha, ele tirou da caixa uma impressora a laser colorida e portátil, até então nunca vista no Brasil, e me disse: “Você quer que eu te mostre o que ela faz?” “Claro, por favor”, respondi. Ele simplesmente ligou a máquina na tomada, conectou no computador, abriu um sistema de cartão de visitas automático e imprimiu uma folha no papel cartão, onde estavam dez cartões em uma folha só, com uma impressão brilhante, forte e de encher os olhos de qualquer profissional da área.

Como não sou gráfico, estou gráfico, disse a ele: “Quanto custa a impressão por folha?” Ele me disse: “R$0,50, preço final com o papel!” E no mesmo momento fiz a conta: bom, para imprimir mil cartões vou precisar de cem folhas a R$ 0,50 = R$ 50,00; eu vendo por R$ 95,00 e levo de dez a quinze dias para entregar. Imaginem se meu cliente receber seu pedido no mesmo dia e dez por cento mais barato? Pensei: vou ficar rico trabalhando do meu quarto! E realmente foi o que aconteceu, mas antes tive que convencer a Tati, que já estava convencida porque me amava de paixão, bom, ela que dizia isto, eu só estou colocando no papel. Tive que convencer meu pai para deixar-me entrar em casa com um robozinho daqueles, que para ele não serviria para nada, mesmo estando ativo na indústria gráfica há trinta anos. E, por fim, convencer a minha mãe a me deixar trabalhar em casa e ter que aguentar os vizinhos me chamarem de vagabundo. Mãe vocês sabem como é: o vizinho em primeiro lugar, depois a imagem do filho. Pelo menos a minha era assim!

Voltando à feira, perguntei ao espanhol quanto custava a máquina e o que precisava a mais para completar a operação. Ele me disse que precisaria do computador, de um scanner de mão (que loucura, de mão mesmo), com o qual tínhamos que escanear a página em duas e juntar no sistema. O scanner serviria para trazer a marca do cliente à tela, para trabalhar na qualidade do vetor em sua maioria. Uma reserva de cartuchos, um mouse e algumas folhas de papel cartão, que para mim não era problema algum.

Fechei negócio com ele e financiei a máquina 100%, sendo que teria verba para pagar até a segunda prestação. Retirei o valor da venda do carro, da comissão de venda da multinacional e comprei o restante.

Chegando em casa, liguei para a Tati e disse: “Se prepara para ficar rica e me ajudar a construir este império, que vai começar no quarto de casa!” Ela chorou de rir, mas como sempre, comprou a ideia. Cheguei na sala e disse para o meu pai de supetão: “Comprei uma máquina gráfica e vou montar uma nova empresa e começar do zero.” Ele, todo animado, me perguntou, com a minha mãe do lado: “Onde será a empresa?” Ficamos por alguns minutos um olhando para o outro, até eu soltar: “Vai ser aqui em casa, no meu quarto.” Eu não teria como descrever a reação deles, mas foi muito engraçado, além de estar estampado na cara deles que o “louquinho” tinha voltado com tudo.

Na sequência, veio a pergunta que não quer calar: “Comprou com o dinheiro do carro?” Pai e mãe só mudam de endereço! Como ser empresário sem sacrifício? Na verdade, fui criado em uma família onde até eu sei, só meu tio, ex-torneiro mecânico, formado em contabilidade, foi um homem bem-sucedido como empresário, e é até hoje. O restante era da turma. Um viva à CLT com muito orgulho. Eu, particularmente, tenho horror, a começar pela cor da CLT, credo.

Passaram-se alguns dias, chegaram o computador e os acessórios, juntamente com o CD do sistema que rodava os cartões e, dois dias depois, a máquina gráfica. Esse dia também foi muito engraçado. A transportadora tocou a campainha de casa (uma coisa que odeio é campainha), e a família toda saiu na porta para esperar descerem a máquina do caminhão. De repente, desce um cara com uma caixinha na mão e entrega para o meu pai, ele perguntou: “É a caixa dos manuais?” Me deu um acesso de riso porque eu já sabia a resposta. “Não, senhor”, respondeu o ajudante, “É a impressora LEXMARK”. Depois de alguns segundos de silêncio, meu pai virou para trás, olhou para mim e não disse nada, mas eu sei o que ele estava pensando: “Jesus, cuida deste menino louquinho”.

Passados estes detalhes, que deixaram minha família de cabelo em pé, subi para o quarto e descobri que as tomadas ficavam atrás da cama. Conclusão: não tinha como mudar a cama de lado porque o guarda-roupa, do ano de 1289 que pesava 1.500 kg, não dava para arrastar. Moral da história: descemos para a sala, e como a minha casa tinha duas salas, uma virou a gráfica.

Depois do jantar, liguei a máquina no computador e na tomada “gambiarra” que passava por trás do freezer, para ligar o restante. Alguns segundos e: pronto, funcionando.

Imagine para alguém, como meu pai, que trabalhava na indústria gráfica há trinta anos e tinha contato só com máquina do tamanho de ônibus, ver sair a impressão – que até então só se via em offset no modo de impressão de grandes máquinas, e presenciar sair uma folha com aquela qualidade para a época; isso porque eu não tinha comentado sobre os custos de impressão e valor de venda.

Quando eu imprimi a folha teste de cartões, ele ficou louco, motivado, feliz, tenso e sem saber o que falar, pois viu que eu tinha dado a tacada certa. Passaram-se alguns minutos de análise da impressão e eu comentei o valor de venda por folha e o custo por impressão, e foi neste momento que realmente ele sentiu que a coisa poderia acontecer.

Depois que a poeira baixou, eu percebi que precisava de uma guilhotina para cortar os cartões, e não tinha percebido este detalhe quando negociei a máquina. Bom, já na segunda-feira, fui ao banco que tinha trabalhado e pedi um empréstimo sem ter como pagar, a não ser pelas vendas dos cartões. Acabei comprando uma guilhotina pequena, automática e muito moderna para a época.

Na terça-feira, estava completamente endividado, sem crédito algum, pois tinha usado todos possíveis e sem o principal: o carro para fazer as visitas e buscar a Tati nos finais de semana, para namorarmos. Por sinal, o namoro estava indo de “vento em popa”, eu saia da minha casa às seis da manhã do sábado, para pegá-la em sua residência às oito da manhã, de metrô e ônibus, e voltava às dez da manhã, com ela, para ajudar a fechar os pedidos e dar vazão às impressões e pacotes dos clientes, que eu teria que fazer na segunda-feira.

O bacana de tudo isso era que a empresa dava lucro e recursos para pagar os empréstimos e guardar um capital de giro para o dia a dia, além do investimento seguinte, que foi um carro novo. Essa é a parte legal de todo esse desafio. No entanto, depois de um ano de muito trabalho, eu já não aguentava mais “virar vinte quatro horas”, com a família toda tendo que trabalhar no dia seguinte e a máquina e guilhotina não paravam. Uma hora imprimindo, outra hora cortando.


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